terça-feira, agosto 17, 2010

_abstinência

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Sobre o que falar hoje?
Vasculhei minhas gavetas em busca de assuntos mas não está nada fácil encontrar. Esses dias, quase todos os assuntos me parecem banais na verdade -- e um assunto banal seria perfeito neste momento -- mas não encontro um que seja digno de ser transformado em letrinhas para encher o seu saquinho, querido leitor. Então pensei em fazer mais uma listinha tosca.
Poderia ser a infinita lista dos meus "não-gostares", ou das minhas "comidas preferidas" [mas ficaríamos em dois ou três itens apenas], ou talvez "coisas que eu não suporto num homem"...mas vem cá? Quem vai querer saber o que eu não suporto num homem? Bobagem, todo mundo sabe que eu tenho o pavio maior do mundo e suporto qualquer coisa, menos burrice. Burrice eu não tolero em ninguém.

Então resolvi falar sobre abstinência. De qualquer coisa. De inteligência inclusive.
De uns dias pra cá eu resolvi me abster de ser inteligente. Agora eu finjo que sou burra, que não entendo algumas coisas, que acredito em tudo o que me dizem. Até dou razão para quem absolutamente não tem, só porque resolvi que a abstinência de inteligência seria a melhor maneira de sobreviver aos dias que tenho vivido. Porque, amigo...amiga...se eu resolver ser inteligente agora, não vai sobrar pedra sobre pedra. Juro. Eu vou sair atropelando tudo para mostrar quem está certo e quem está errado, vou ganhar a luta por knock out e levar o cinturão de campeã absoluta, invicta, eterna, com o pobre adversário arremessado contra as cordas, pedindo mais. É, você leu certo: não é pedindo água, é pedindo mais.

Abstinência de comida.
Pelos motivos errados, resolvi me abster disso também. Como, mas o faço por obrigação ou para acompanhar a família que não tem culpa das minhas decisões imbecis. Resolvi me abster de ser gorda e de envelhecer sem digninade, e para isso estou -- pela primeira vez (segunda vai?) na vida -- tendo caráter suficiente para voltar a ter o velho e bom corpão aquele que alguns de vocês chegaram a ver e outros nem imaginam que um dia eu tive. Então, também pela primeira vez na vida, abstenho-me de ser a mãe e esposa perfeita que sempre fui, para usar 3 horas do meu dia só para mim. Céus! isso parece uma bobagem para você e para o resto do universo, mas até o médico da familia sabe que eu jamais me dei esse direito tão básico.

Então recapitulemos: Estou em plena abstinência de inteligência, comida e Amelice (ou seria Ameliazice, whatever).
Ainda no projeto "Devolve o Meu Corpo", estou em abstinência de audição. Sim, porque é difícil ficar ouvindo qual aparelho é melhor para gordura localizada e o que é bom para celulite, e que a Jackie Curi (quem?) faz manthus, a Monique Evans faz 300 sessões de bronzeamento por dia e por isso a pele dela é laranja e mais grossa do que chapéu de cangaceiro (e o cérebro dela cozinhou), a outra Jaqueline fez estrias horríveis na gravidez mas sumiu tudo com sei la o que, e o creme da fulana, as bolas da ciclana que emagrecem 520 quilos por dia e tal. Sacal. Então agora eu sorrio com a maior cara de interesse ao escutar qualquer dessas coisas e me abstenho de lembrar quem sou eu. Sim, porque se eu lembrar, eu saio correndo enrolada na toalha pelas ruas feito uma louca, e sou presa, porque o lugar fica ao lado da delegacia. Ah...e abstenho-me de realizar a dor. Não sinto. Pode apertar, puxar, espetar...não vou sentir. Mas antes que você dê palpite, saiba que estou me abstendo de treinar sim. E daí? Mas estou correndo, porque correr gera uma deliciosa abstinência cerebral. Eu não penso enquanto corro. É lindo.

Fora todas essas abstinências maravilhosas, eu também tenho sofrido com a conclusão de que eu sou uma criança mimada que não sabe ouvir "não". A abstinência do "sim" me faz sofrer, chorar e arrancar os cabelos. Tenho vontade de bater a cabeça na quina da mesa até sangrar e depois chamar a mãe pra fazer drama dizendo que alguém me bateu. Sinto-me de castigo sem assistir meu desenho preferido, e detesto detesto detesto isso! Muito! [batendo o pé no chão e chutando o ursinho de pelúcia] Saco! Droga! Gente boba, feia e chata!
E ainda tem a abstinência de viagens que me faz sofrer mais do que todas as outras. Sinto falta de Los Angeles. Sinto falta do cheiro dos lugares que eu amo. Sinto falta das minhas amigas. Eu poderia viajar...tenho milhas...tenho liberdade...tenho tudo o que preciso, mas e a minha obra? Ficar sem ver a casinha crescer? Never! Never! Então fico sem mais um desenho preferido em prol do bem geral da nação.

E assim passam os dias. Eu em crise de abstinência de algumas coisas por opção outras por imposição, tendo meus delírium-tremens baixinho debaixo do edredon sem ninguém saber. Tá frio né? Se eu tremer e gemer, é porque o lençol elétrico desligou.

Beijo pra você que é normal.

6 comentários:

Fabio Piva disse...

Abstinência, ahn? [anotando, anotando]. Ok, abstinência. Acho que é disso que preciso no momento -- me abster de uma série de humanices, dessas tão humanas que nos tornam assim, tão humanos. Humanos DEMAIS, em algumas situações. Acho engraçado que, nessa prática diária de ser gente, precisemos nos abster tantas vezes do que os separa dos demais bichinhos de nosso senhor. Mas é assim -- pena que poucos notam.

Me abstenho de explicar o sentido (nebuloso) deste comentário. E me abstenho de apontar qualquer eventual dono da carapuça que acabei de tricotar.

Beijos,
Fabio Piva
http://paciencianegativa.blogspot.com/

Marina Pavelosk Migliacci disse...

obrigada por escrever

Mercedes disse...

Mari...

você é demais! :)

Pedro Rocha disse...

Abstinência cerebral durante a corrida? Ótimo. (ta, você não pediu nenhum tipo de solidariedade. Ponto.) Aliás, qualquer atividade aeróbica exerce esse "poder" sobre mim também.


Post estranhamente perfeito!


Só pra variar...

Marina Pavelosk Migliacci disse...

você que é! ;-)

Anônimo disse...

Faz tempo que não venho aqui, acho q menos de uma semana e já tem um turbilhão de coisas pra ler, não vou me abster de vc... ,as tô pensando seriamente em me abster da comida tb... e recuperar tb o q está lá atrás num passado não muito distante..

Beijão, Edilene