segunda-feira, fevereiro 16, 2009

Alô?

"Eu gostaria de falar com o Sr. Mercedes."
"Pode falar...é ela."
"Ah...nossa...é que aqui dizia Mercedes, então eu achei que fosse SENHOR."
"Como assim?"
"É...pensei que fosse um senhor, Mercedes."
"Mas Mercedes é nome de mulher."
"É? Não sabia...achei tão diferente..."
"E me ligou para...?"
"É que a revista Isto É está com uma campanha de incentivo à leitura...a assinatura vai sair por só 6 vezes de 35 reais."
"Puxa que bom...mas aqui em casa ninguém lê."
"Não?"
"Não...obrigada."


"Alô...?"
"A Senhora Menezes se encontra?"
"Não tem ninguém com esse nome."
"Não?? E o Tiago?"
"Também não tem Tiago."
"Ai...é da telefônica, eu sou o técnico, precisava terminar um reparo..."
"Não seria Mercedes? Diogo?"
"Ah...isso!"


"Por favor o Senhor Diogo?"
"Ele não se encontra...são 3 horas da tarde...ele trabalha."
"A que horas eu posso encontrá-lo?"
"A que horas você chega na SUA casa?"
"Não importa, Senhora...a que horas ele se encontra?"
"Depois das 9."
"Só trabalhamos até as 18, senhora."
"O que você quer que eu faça?"
"Tem um telefone onde eu possa encontrá-lo?
"Alguém liga pra você no trabalho?"
tuuu. tuuuu. tuuuu. tuuuu...


"Alô? Senhor Luiz?"
"Não."
"O Senhor Luiz se encontra?"
"Ah!...não."
"A que horas ele chega?"
"Não sei...ele não mora aqui."
"Mas ele chega em algum momento?"
"Ele não mora aqui."
"Sim, mas ele vai aí as vezes?"
"Só se vem escondido, porque eu não conheço nenhum Luiz."
Tuuuu. Tuuuu. Tuuuuu.

"Senhora Mercedes, então, daqui a uns cinco minutinhos, uma mocinha muito simpática vai ligar para a senhora...a senhora explica que falou comigo - o Jean - e que quer cancelar as assinaturas...ela é uma mocinha muito simpática...a senhora explica para ela. Assim ela cancela as assinaturas e bloqueia os seus cartões para nunca mais acontecer de a senhora receber revistas indesejadas, está bem? Então...daqui a uns cinco minutinhos, uma mocinha muito simpática vai ligar...a senhora atende, entendeu? Daqui a uns cinco minutinhos, uma mocinha muito simpática..."
"ENTENDI, JEAN! CHEGA!"

No dia seguinte...

"Alô?"
"Senhora Mercedes? O Jean da editora me pediu para ligar para a senhora para confirmar as assinaturas das revistas Isto É Gente, Menu, Planeta, blablablablabla"
Tuuuu. Tuuuu. Tuuuu.

Me diz pra que é que eu ainda atendo telefone!

terça-feira, fevereiro 10, 2009

** momento I - setembro/1989

(parte integrante de auto-exílio)


Como é que faz
para omitir uma explosão
de todo seu ouvinte,
todo transeunte?

Como é que faz
para esconder um céu brilhante
de todo pássaro,
seu habitante?

Como é que faz
para reduzir
"Este Amor"?
Apagar
"Este Amor"?
Esquecer
"Este Amor"?

Como é que faz
para não tê-lo vivido?
não tê-lo bebido aos tragos?
não tê-lo todo nas veias,
nos tecidos?

Como é que faz,
me diz?
Para falsear este tudo,
este tanto,
e guardá-lo todo
- este todo inteiro -
em algum canto?




auto-exílio é uma série de textos e poemas escritos à máquina, encontrados perdidos numa pasta velha no sótão da minha casa. são fragmentos de da vida que eu levei de 1981 a 1989. de tempos em tempos, ou sempre que eu não tiver o que dizer, vou publicar um deles.

**momento I é o primeiro de três poemas escritos para a mesma pessoa, que fez parte da minha infância e reapareceu vinte e dois anos mais tarde, depois foi embora...do mundo.
não pergunte! eu tenho amnésia.

segunda-feira, fevereiro 09, 2009

Desabafo


Descobri que não há tempo para imaturidade emocional. Não há tempo para cair, deixar o mundo me arrastar, me debulhar em lágrimas e esperar o tempo passar. Ele passa, e quando tudo acaba, os problemas continuam no mesmo lugar.
Descobri que perder alguém e mais difícil do que imaginei. Eu não tenho muita experiência com tristezas em geral. Sou muito ruim em "ser triste". Se precisasse viver disso seria um grande fracasso.
Mas ai! Dói tanto! Mesmo preparada, mesmo sabendo que era impossível evitar, mesmo estando pronta...Hello? Não tem ficar pronta para um coisa dessas. Como disse a minha mãe: "passei cinco anos sabendo que isso ia acontecer, e na hora que aconteceu, foi tão de repente..."
É assim...de repente. Você sabia o que tinha de fazer, teve tempo de preparar tudo, mas "Não agora! Espera porque eu não disse tudo. Espera que eu tenho mais um carinho, mais uma palavra, mais um segundo..."
De uma hora para outra, aquela pessoa forte, poderosa, sabe aquela? Ficou minúscula, pequenininha, com vontade de pedir colo. Mas não dá tempo, sabia? Só dá pra ser criança quando ninguém precisa da gente, e este é um dia que eu nunca vou ter. Sempre alguém estará precisando de mim e eu tenho de estar inteira. "Hey! Devolve meus cacos, porque alguém está mais quebrado do que eu!"
Quando eu tinha uns vinte e poucos anos e achava que sabia tudo, fui a uma astróloga. Esqueci quase tudo o que ela disse, é claro, com excessão de duas coisas que me marcaram bastante:
1. Os sagitarianos são o seu chão. Toda vez que a vida estiver fora do rumo, um sagitariano virá mostrar que voce está viva e levá-la de volta ao caminho certo, mesmo que pelo atalho mais penoso. Ela disse uma outra coisa sobre eles também, mas não cabe nesse texto.
2. Voce parece forte. Voce é forte. Voce não precisa de ninguém e todo mundo sabe disso. Por isso, voce vai passar os piores momentos da vida sozinha.

Verdade 1 e verdade 2. Dessa vez eu não fiquei sozinha. Não sozinha nesse sentido comum...só o meu sofrimento que foi meio solitário. Eu não podia chorar um monte e mostrar que ainda sou a narigueta do pai, porque havia pessoas muito mais frágeis precisando de colo. Ao mesmo tempo, minha filha se recuperava de uma cirurgia grande e meu marido teve um treco e eu achei, por eternos 40 segundos, que ele fosse morrer também. Não seria justo...juro que não seria justo!

Então como? Me diz, como? Tive que engolir o choro e seguir em frente. É bom...é...mas é ruim, porque neste momento eu me sinto quebrada. Faltam pedaços e eu estou vendo a fresta deixada por eles. Está difícil escrever, está difícil me organizar, está difícil trabalhar...ao mesmo tempo eu não paro, não sento, não leio, não vejo TV, não relaxo. Passo o dia fazendo coisas que não preciso fazer, sem parar um minuto, até cansar e dormir - o que só acontece depois das três da manhã.
Eu queria sentar e chorar por horas para poder acabar com isso e voltar, inteira, para vida que estou fingindo não ver.

Thanks for listening.

Mg