sexta-feira, junho 15, 2007

A beleza e as palavras

O que está na beleza? O belo é admirando desde sempre, desde que o mundo é mundo, ou antes, porque deve ter sido lindo assistir ao big bang e a cada minúsucula partícula de transformação de tudo até o mundo que vemos hoje e tentamos destruir.
Belo é o céu, belas as estrelas, belas as mulheres, belos os homens quando adultos, belos os rostos, as mãos, os campos, o mar, os rios. Belas as palavras.
De todas as coisa belas, a mais bela aos meus olhos...é a palavra. Nas línguas que eu sei, elas fascinam.
Algumas coisas simplesmente não podem ser ditas em português, como AMAZING. Amazing só é really amazing se for assim. Já eu te amo, I love you, je t’aime, todas funcionam igual. Mas outras não. Não há nada como escutar sussurrado ao pé do ouvido, bem baixinho, “my love...” Há coisas que são mais “benditas” em inglês. Outras podem ser ditas em qualquer língua, desde que, por favor, sejam ditas.

Eu diria que as palavras são uma criação do diabo, se eu acreditasse nele. Elas seduzem. Elas enganam. Elas convencem. Elas explicam mais do que devem. São usadas com um sorriso nos lábios ou com lágrimas nos olhos. Nem sempre as palavras são verdadeiras. Mas sempre cumprem sua missão. Poucos mísseis têm a precisão das palavras. Poucas armas são mais perigosas. É por isso que sempre que alguém me diz que eu tenho um dom divino eu sorrio. Não...divino assim “feito por deus?”...não. Este dom não é divino. É o dom de persuadir. De iludir. De fazer brotar paixão em corações sossegados. De trazer à vida sentimentos esquecidos.
Se eu faço chorar de emoção a quem lê, não é divino.
Se eu salvo uma alma ao escrever uma linha, não é divino.
Se eu tranquilizo uma angústia ao contar de um amor, não é divino.

Não é divino porque é irresponsável. Egoísta, o dono das palavras diz apenas o que sente. Talvez amanhã nem se lembre. Claro, lembrar por que? As palavras já saíram do estômago, da alma, do fígado, do coração. Elas já tiraram a fórceps o sentimento que estava lá. Agora ele se foi…agora ele virou vapor…agora ele já não é. E isso – que já não é – sai por aí aspergindo sentimentos e forjando soluções na vida de outras pessoas. Não é divino. É obra de algum outro deus ardiloso, brincalhão, que quer ver o mundo pulsando como um coração perdido.

Eu vivo como uma criança que não tem certeza se comer bolo quente é certo ou errado. Se ser bela é bom ou ruim. Se um sorriso é um presente ou uma facada no peito. A beleza e as palavras rondam a minha vida desde a infância. Venus, ou seja lá que força tem aquela bola brilhante no céu, traz para a minha alma um prazer imenso nessas duas drogas viciantes: palavra e beleza. Ambas tão eternas quanto efêmeras, por isso mágicas. Ambas causam extases momentâneos e inesquecíveis. Ambas são armas fáceis e contundentes. Ambas movem a vaidade humana a um patamar inimaginável. E ambas se assemelham ao nirvana por raros, rápidos e inebriantes instantes.

E o que é a beleza? E o que são as palavras?
Fatias de bolo quente com perfume de infância numa tarde de inverno…o doce pouco a pouco tomando a língua…o calor aquecendo o corpo por onde passa…o sabor chegando aos olhos que se fecham de prazer. Segundos de extase quase eternos.



**me recuso a acentuar a palavra EXTASE. Uma coisa linda que se transforma numa palavra feia de se ler por causa de um chapéu ridículo.

9 comentários:

Felipe "Tito" Belão disse...

é um egoísta quem diz, somos todos então.
Todos egoístas num andando de mãos dadas.
Nos perdemos, é claro, no meio de tantas palavras, sentimentos, êxtases.

Porque, apenas por uns segundos nos permitimos sentir como no dia anterior, novas sensações chegam rápidas e nos levam e chamam os dedos a dançar nos teclados.

Nada mais.

Alice Salles disse...

"Não é divino porque é irresponsável. Egoísta, o dono das palavras diz apenas o que sente."

Realmente... eu às vezes me recuso a pensar assim por acreditar demais na honestidade que mora em certas pessoas que me encantam, ou melhor, que me geram mais e mais vida, mas vc tem toda a razão.

Alice Salles disse...

mesmo assim, mesmo sendo egoísta é lindo...

Marcos Freitas disse...

tears in the rain
words in the wind

que lindo! que linda!

Marcos Freitas disse...

aah, e no budismo há o "fazer andar as palavras" ...

e egoísta mesmo é aquele que morre com as palavras que deveriam ter saído por aí a andar e a criar outras belezas, encalacradas dentro de si!

beijos
m.

Flavia Melissa disse...

li e amei.
no time.
later.

looove so much.

Anônimo disse...

Ahhh Mercedes...se todas as pessoas do mundo tivessem o seu egoísmo...aposto que ele seria muuuuuuito mais bonito...mais humano...mais cor-de-rosinha!!!!
Amooooo

Anônimo disse...

agora com mais calma...

eu acho que as palavras são belas sempre, mesmo quando causam o inferno. e são belas porque tem a capacidade de construir e destruir pessoas, reinos e até universos.

"No princípio tudo era o caos; fez-se então o verbo, e o verbo era Deus e Deus era o verbo, e Deus disse, 'faça-se a luz', e a luz se fez".

que coisa mais louca!, mas as palavras têm poder. quando proferimos uma palavra criamos todo um universo que passa a existir como a luz e as árvores e os seres vivos sobre a terra passaram a existir a partir do que Deus dizia...

palavras apenas... palavras pequenas... palavras... momentos! e há de se ter discernimento para descartar aquelas ditas em momentos inoportunos, mal pensadas e mal sentidas.

mas eu, ao menos, amo todas elas. até as feias e os palavrões até. não sei o que seria da beleza da minha vida sem todas as palavras que existem nela...

beijos enormes!

Su disse...

lindissimo este seu texto

partilhei.o com os devidos creditos


li, reli
fez-me bem-----
ando rodeada de palavras ocas

obrigada