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Peguei o carro, bati a porta e não olhei pra trás.
Chega! Não tinha como passar mais tempo sem olhar nos olhos dele e ver se tudo o que ele me fazia sentir de longe se repetiria assim, olho no olho. Muito medo. Muito medo, porque só de pronunciar a palavra “olho” me vira o estômago. Motim das tropas de borboletas! Elas estão armadas, atirando pra todo lado e...ai, pelo amor de deus! Parem de bater essas asas que eu vou passar mal. Frio no estômago master.
Cheguei em frente à casa e pensei dez vezes. Vou não vou, vou não vou...fui. O portão estava aberto...eu entrei. Nem 15 metros separavam a porta do portão, mas acho que andei uns 10 quilômetros...aquilo não chegava nunca e o único pensamento que eu tinha era o par de olhos escuros olhando dentro de mim. DENTRO, porque eu nunca consegui conceber que ele tivesse um olhar menos poderoso do que isso.
Respira...
Bati na porta uma vez. Nada. Pensei: “ótimo, vou embora.” Mas assim que virei as costas a porta se abriu. Ai. E agora? Desviro? ou faço a louca e corro pro carro e depois digo que não era eu? “Quem, eu? Na sua casa? Imagina...”
Não deu tempo. Borboletas em guerra, frio na barriga, olhos aterrorizantes e eu ainda de costas...e ouvi a voz. O que? VOZ? Eu nunca tinha ouvido a voz dele. Esqueci de contar que esse era outro medo: a voz que eu ouvia quando pensava era linda. Não! Cala a boca! Eu não acho voz de locutor linda...Eu to falando de uma voz gostosa...se bem que eu só pensei nela assim, no meu ouvido...não sei como soaria se ele falasse mais de longe...Tá! Para de ser louca. Foco.
Respira...
A voz disse: “Viu como não é tão longe?”
Que diabo de frase é essa? Sabe quanto tempo eu sonhei com a primeira frase? Vamos falar de geografia? Trânsito? Pavimentação de estradas? Pelo amor de deus, você só tem mais uma chance e eu vou embora. Pois é...pensei. Só que ele não disse a segunda frase. Acontece que eu virei pra ele e vi os olhos. Meu deus! Os olhos eram mais fortes do que eu pensei. Eles não olharam dentro de mim, eles me sugaram pra dentro deles. Os olhos sorriam de um jeito que não tinha como não saber tudo o que estavam dizendo. Ou eu que estava nervosa. Não...mentira. Eu estava nervosa sim, mas os olhos estavam gritando! E aquele olhar foi o suficiente pra eu não saber mais nada. O que mesmo ele tinha perguntado? Longe? O que que é longe? Perto, super perto... Quarenta centímetros de distância? Isso não é nada e com um movimentozinho minúsculo eu consigo voar no seu pescoço e abraçar você pra sempre.
Eu não posso imaginar a minha cara. Acho que eu até prefiro não imaginar, porque eu devia estar olhando pra ele como um sapo na boca da cobra. Romântico?
Aquilo durou uns três milhões de segundos. Nós dois ali, olhando um pro outro, trocando faíscas e pensando “Ai meu deus e agora?” (pelo menos eu pensei), e nada acontecia. Total WTF moment. Mas aí ele esticou o braço, e me pegou pela mão...me puxou pra perto e me abraçou falando no ouvido: “Não acredito que você tá aqui...”. Ai a voz, a voz, a voz...eu acertei em cheio! Era exatamente como eu imaginei.
Pensei em respirar, mas não descobri como fazer isso. Assim que a voz terminou a segunda frase - que eu vou chamar de primeira, pra esquecer aquela outra - ele me beijou no canto da boca. Mas assim...não foi um selinho no canto da boca. Foi um beijo de canto de boca daqueles que você fica perdida sem saber se vira e beija direito ou se finge que nem notou. No meu caso, acho que não consegui fingir coisa nenhuma, mas segurei a vontade de virar e lascar um beijo decente nele. Que raiva! Eu odeio esses joguinhos de sedução. (NOT)
Ele me puxou para dentro de casa sem desgrudar o olhos de mim, tirou a bolsa do meu ombro e jogou num sofá, tirou a chave do carro da minha outra mão, jogou junto, desenrolou meu cachecol sem mover os olhos um segundo...eu ainda estava na boca da cobra, completamente hipnotizada e, muito provavelmente, com cara de quem diz: “eu morro de medo de morrer, mas se é você quem vai me matar, por favor, seu moço...mata bem devagar.” Ai como eu sou besta. Eu tenho a cena do cachecol tatuada no cérebro...nunca vou esquecer os olhos dele naquela hora. Um silêncio mortal. Só a dança daqueles olhos - encantador de animaizinhos indefesos.
Assim que o cachecol deu a centésima volta para fora do meu pescoço, ele levantou os cantos da boca num meio sorriso torto, fechou os dois olhos numa piscada longa como se fosse me libertar daquela prisão , inclinou a cabeça em slow motion - ou eu estava completamente inebriada, embriagada e entregue - chegou mais perto de mim e beijou o meu pescoço. Ai ai ai...PAUSA. Deixa eu explicar que você não pode ir beijando o meu pescoço no primeiro encontro. Principalmente se faz uma semana que você não faz a barba. Não pode! Eu sou uma pessoa fácil, entendeu? Eu me controlo, mas determinadas atitudes valem por uma garrafa de vodca, e aí babau. FIM DA PAUSA.
Um beijo no pescoço que fez uma breve passagem pela minha orelha, passeou pelo rosto, e terminou num longo, molhado, lambido, delicioso beijo na boca.
Ai ai...esse era o outro medo. Epic win though. Nada mais a temer. Se todo mundo prestasse atenção no beijo, ninguém teria decepções na cama. Básico. Lição numero 1: um beijo afoito, urgente, com força, igual a sexo afoito, urgente, com força, quiçá com acrobacias e direito a triplo mortal carpado, atletismos, Daine dos Santos e ai que preguiça! Um beijo seco, sem língua, ou pior, língua estranha que parece um bife na sua boca, é igual a... é... não sei, porque na verdade eu nunca me arrisquei a passar de um beijo assim. Eca! Agora... um beijo como esse - lento, mole, molhado, com tempo, um explorando milímetro a milímetro a boca do outro - que hipnotiza e amolece as pernas... isso é igual a sexo bom. Com tempo... com calma... deixa eu perder uma eternidade aqui que tá bem bom... Deixa eu conhecer mais esse pedacinho... Bem, sexo bom pra mim. Sei lá se é bom pra você, mas também se você não gosta assim eu nem quero saber como você gosta. Azar seu!
Foi tudo muito incrível. Tudo muito de verdade. Brincadeira de gente grande, sem se enganar, sem achar que aquilo era pra sempre, mesmo tendo a imensa tentação de deixar o romance ser maior que tudo. Duas pessoas estabanadas que se deixam tomar por uma total falta de controle quando uma paixão penetra, entrona, metida, que simplesmente não foi convidada pra festinha entrou e comandou a festa assim, do nada; duas pessoas assim, tendem a querer que aquilo dure pra sempre. Tendem a se deixar enganar só um pouquinho, porque seria bom se amanhã de manhã a gente fosse namorado, se saísse de mãos dadas pra algum lugar, e telefonasse pra dar boa noite, e demorasse pra desligar porque ficar longe é ruim. Mas somos como dois alcoólatras habituados à abstinência e a nossa história é vivida assim por horas, por dias, só mais 24 horas porque amanhã não sei. E foi com essa urgência de quem pode morrer amanhã e precisa aproveitar os últimos minutos de vida, segundo por segundo, - mas sem pressa para não ser triste - que ele fez amor comigo. Não. Eu fiz amor com ele. Não sei, espera... não foi assim. A gente também fez sexo, assim... sexo. Mas fez amorzinho bonitinho. E conversou mais do que eu esperava, e eu esperava muito. Foi lindo, e foi divertido, e foi, sim, romântico, e foi engraçado às vezes, e se tiver que acabar daqui a pouco eu vou morrer de saudade.
Ai.
Doeu.
Fiquei romântica. Pareço triste, até. Mas não... não estou não. Na verdade bem feliz. Outro epic win. Mas eu não vou contar os detalhes sórdidos que você estava esperando. Só vou dizer que algumas coisa que acontecem na vida são VIDA pura. É como se você abrisse um frasco de “vida concentrada” e bebesse inteiro, pra viver um ano em um dia. Uma overdose de milhares de sentimentos e sensações misturadas, uma vida que é só sua. Um ato ao mesmo tempo egoísta ao extremo, do tipo “eu quero essa pessoa pra mim e fim”, e de uma generosidade imensa, porque você quer dividir com essa pessoa cada gole desse extrato mágico concentrado e vê-la bêbada disso ao seu lado. Um presente duplo: a gente abre junto o pacote, ganha esse presente incrível, e nunca mais vai esquecer. Lindo.
Pois é. Foi assim.
Não seja besta! É claro que essa história é ficção. O primeiro que perguntar se é auto-biográfico eu rogo uma praga e vai ficar burro assim pra sempre.
Bom dia flor do dia.
(Rafaela Pedro, viu só? Falhei de novo...cortei pra lareira.)