segunda-feira, maio 10, 2010

_não me deixa no inferno


O que acontece com o cérebro depois de um derrame? Não...eu sei das lesões. Eu sei das dificuldades todas. Mas com o pensamento? O que acontece?
O que acontece é que ninguém sabe coisa nenhuma. A ciência engatinha e muda de idéia uma vez por mês. Antes nós, humanos, éramos o único animal racional, agora já sabemos que as baleias se organizam para pescar, muito mais do que um bando de homens famintos para coletar doações num caminhão da Cruz Vermelha. Também sabemos que algumas espécies de macacos entendem o que falamos - é, eu vi o Fantástico hoje - e os golfinhos têm uma língua com alguns vocábulos diferentes e a usam bem direitinho.
Fato...não sabemos se aquela pessoa que não anda, não fala e não reaje tem um cérebro vazio, ou se ali, dentro do aparelho supostamente corrompido, suas memórias e pensamentos estão ou não intactos.
Com esta dúvida na cabeça, acompanhe o meu pesadelo...
Então eu saía de casa para fazer alguma coisa quando passei por uma senhora numa cadeira de rodas, sendo empurrada pela enfermeira. Se eu sair de casa todos os dias as nove da manhã e as duas da tarde, vou passar por ela, no mesmo lugar, fazendo seu passeio diário. Bom para ela. Mas aí minha pobre cabecinha atormentada entrou em pânico: digamos que fosse eu. Ou você. É vamos falar de você, porque eu tenho medo de falar essas coisas sobre mim. Vai que bate um vento e....bom...
Você é uma pessoa genial. Lê muito, é super informada, sabe tudo o que acontece no mundo todos os dias, tem um gosto musical respeitável, não é lá exatamente um intelectual mas também não tem muita paciência para a burrice generalizada que assola a mente humana. Tudo isso é meio que uma lenda, mas você não nega porque é vaidoso e lhe serve muito bem a cadeirinha de "elite intelectual". De qualquer forma, suas opiniões sobre as coisas, fatos, religiões, mídia e a vida em geral diferem e muito da opinião das massas, o que faz com que você seja um pouco mais intranzigente e viva meio isolado dos outros seis bilhões de humanos habitantes do planeta. Entendeu o quadro?
Pois bem...aí você tem um derrame. Suas pernas agora não obedecem o comando do cérebro. Tudo bem...você não vai andar. Não é tão mal assim já que você já não era mesmo a fim de sair de casa. Mas aí seus braços ficaram meio burros. Isso já complica um pouco. Sua língua virou um músculo surdo que não atende a nenhum dos seus pedidos e tudo o que você diz são uns blablablas...você era mais eloquente aos cinco mêses.
Tudo parou. Sua familia não tem esperanças de ver reações em você. Parece que você escuta, mas não responde...não se sabe bem.
A vida de todo mundo continua: você agora mora com seu filho, sua nora é um amor mas trabalha fora, seus netos falam com você normalmente mas são ocupados...sobrou a enfermeira.
Ótima essa enfermeira. Ela também é fisioterapeuta e terapeuta ocupacional. Cuida dos seus exercícios, sua higiene pessoal, sua alimentação....mas fala. É aí que começa o pesadelo. Presta atenção...
A enfermeira fala...um amor ela...mas fala. Ela fala, mas fala sobre coisas que não interessam a você. Ela não só fala, como cantarola. E cantarola músicas que você odeia! Ela cantarola "Meteoro da Paixão". Ela gosta de Victor e Leo. Ela é fanzoca do Zezé di Camargo. Ela viu "Se eu Fosse Você", o um e o dois, três vezes, e ADORA o Tony Ramos. Ela liga a televisão as cinco e meia...coloca você para ver Malhação, depois a novela das seis, das sete, das nove, e na hora do jornal ela muda para o TV Fama. Ela acredita que o Zé Mayer é lindo. Ela jura que os gêmeos de Viver a Vida são gatíssimos. Ela lê livros de auto-ajuda em voz alta para você. Os filhos dela se chamam Jeferson, Anderson, e Geysilene.
Hello? Você era ateu e não acreditava em inferno, agora o inferno acorda você todos os dias para tomar café da manhã! E se duvidar ele ainda diz que encontrou Jesus...e conta tudinho sobre o culto de ontem. Onde senhor? Onde está a justiça divina?

Eu não posso cruzar com a velhinha do passeio diário que tenho vontade de parar o carro e sequestrar a pobre. "Vem, minha senhora. Eu vou livrar você desse pesadelo!"
Eu tenho medo...muito medo. Por favor, você que é meu amigo, minha amiga, irmã, filho, filha, alguém! Se um dia eu pifar...lembre-se de quem eu era. Pelo amor de deus faça uma entrevista decente com a minha pseudo-companhia-eterna-quase-inferno. Conte a ela do que eu gostava, entregue apostilas, livros, filmes, para que ela tenha assunto para "conversar" comigo. Se não for possível, por favor, uma injeção de sicuta, uma overdose de algum calmante...mas não me deixe ir para o inferno. Não para esse.
Grata.

19 comentários:

Marcos Freitas disse...

ahahahaha sensacional!!!

a princípio me pareceu meio o escafandro e a borboleta mas quando chega o pesadelo ...é sensacional!
um ateu no inferno, o pesadelo (ao) vivo

bjs
m.

ARAY disse...

Até para os ateus, só resta rezar para ser livre desse pesadelo.

ARAY disse...

Afinal, até Nietzsche ao final da vida, reconheceu:
-Só Deus para salvar este mundo.

ARAY disse...

É verdade que fazer nossa parte também ajuda ' exercícios físicos e mentais sáo indispensáveis.

Anônimo disse...

Me,
conforme-se com poucos post. Não há muito o que dizer. Você já disse tudo. O inferno é aqui. Esta é uma possibilidade sobre a qual evitamos pensar. Se um dia acontecer, será com o vizinho. Comigo não. Next! Muito triste. Melhor uma que te fale sobre Jesus do que não te dê comida, não seja carinhosa ou te deixe cagada. É o princípio das babás dos filhos a quem vc faz vista grossa quando chega em casa e eles estão lindos, alimentados, limpos e felizes, mas cantando o bonde do tigrão. Você até compra o CD pra animar a festa.
Faz aí o post sobre ser loira x morena e deixa este que é
muito deprimente pra lá...
Beijos
Jacque

RK disse...

Olha Moça:

Muito foda pensar desse jeito. Viver isso sem poder reagir seria o caos com certeza. Agora o mais tenso é ficar envolvido com o texto até o ponto de sentir o problema. Esse tipo de leitura é um tanto desagradável, porem necessária principalmente pela reação que causa na cabeça de quem lê.
Quanto ao Post da anônima acima. Opinião cada um tem a sua. Agora, quer ler um post raso ou engraçado; procura outro blog e não enche... Sente a sensação desse aqui e tenta aprender com isso.
Abraço do Kruka

Anônimo disse...

Menos Kruka bem menos..... não entra no bonde e tenta sentar na janela, existe todo uma intimidade entre Jacque e Mercedes para elas se falarem assim !!!!

Cada um com suas opiniões mas "não enche" é too much...

Bjos para todos,
TT

Anônimo disse...

Dr. Rafael,
segui sua recomendação e fui no seu blog tentar ler os seus posts que são bem rasos, mas também são muito chatos e mal escritos... e não consegui terminar. Pelo visto ninguém consegue, já que não existe comentário algum em nenhum post.

Se o meu comentário acima te "encheu", problema seu... A única opinião que me importa aqui é a da dona do blog, e tenho certeza que a Mercedes entendeu o que eu quis dizer.
Jacque

MgMyself disse...

Calma gente...Calma.

Acho que o Kruka não viu que tava assinado. Ontem no Twitter eu reclamei de alguém que postou anônimo (em outro post)e gritei: "Escória da humanidade: ASSINA O SEU LIXO."

Acho que ele pode ter associado uma coisa com a outra. Anyway, já que a opinião que vale é a da dona no Blog, aqui vai a minha:

A Jaque falou como se não me conhecesse "Faz aí o post sobre ser loira x morena e deixa este que é
muito deprimente pra lá..."
e o Kruka achou demais...e disse o que a gente diria pra quem vem aqui reclamar dos meus posts. "Não enche". Não foi tão grave assim. Já li coisas bem piores por aqui.

E o resumo da ópera é: Adoro a Jacque, adoro o Kruka. E todo mundo pro banquinho do castigo já!

Beijos, amores.

Mercedes

Anônimo disse...

E eu tia ????? Me comportei né ???
TTs

MgMyself disse...

Você foi boazinha. Vai ganhar pirulito. :)

RK disse...

Anonima

Desculpe se ofendi. nao era a intenção.

Eu não sou Dr. não fiz doutoradado.

Que bom que o que eu escrevo gerou alguma reação em você. Tenho outros blogs tbem caso queira tentar mudar de opinião...

Eu gostaria de ler o que você escreve. Diga onde e lerei imparcialmente.

Voltarei para meu castigo Prof.

braxs

Alice Salles disse...

é, preferível morrer do que viver nesse inferno... só de imaginar já bateu um desespero!

rafaela disse...

Mê!
Sou intrometida o suficiente pra dizer que com certeza não vou permitir que vc viva neste inferno!
Mas não mesmo!

bjs

Mercedes disse...

To tranquila Rafa,

Você cuidando de mim e a Carol Garofani me dando sopinha na boca até os 120 anos, como ela prometeu...Posso dormir sossegada. :)

Familia Caldeira disse...

Mercedes,

Leia "Stroke of insight" e veja a história de uma médica cientista, especialista em cérebros e derrames, que conta a história de quando ela própria teve um derrame, o que sentiu, o que passou, e o lado bom da tal experiência, se é que dá para escrever assim.
Beijos e parabéns pelo texto!
Adré

MgMyself disse...

André,

Eu não li, mas vi um documentário curto sobre ela. É demais!

Obrigada....

Beijos

(pra você saber, a verificação de palavras aqui escolher "ANDRES" na hora de responder esse comment. :)

Daniela do Carmo disse...

Esse é muito o meu pesadelo também! Mas eu ia pro outro lado, sempre fiquei com medo de não arrumarem meu cabelo direito. Porque vão pentear de qualquer jeito, vai ficar colado de um lado da cabeça e o outro vai ficar voando. Ninguém coloca antifrizz em quem tá todo vegetando!! Uma vez no meu blog isso, que a primeira gaveta da cômoda tem umas faixas de cabelo. Na falta de paciência de ajeitar, me deixem de turbante que é melhor. Crio até um estilo, mas não fico parecendo doida de cabelo grudadinho na cabeça, com gremlins soltos. E a outra parte refere-se ao toc. Vão deixar minhas coisas caírem no chão e não vão lavar, vão mexer em dinheiro e vir limpar minha boca (porque vou babar, claro), ou seja, pesadelo em cima de pesadelo. Pobres inválidos, pobres de nós!!!!

Pedro Rocha disse...

Medo! Só de pensar que o nosso mundo pode desabar da noite pro dia. Pior é que não existe vacina, reza forte, imunidade ou qualquer tipo de blindagem contra essas coisas. Acho que é por aí mesmo: manter a família e os próximos bem orientados e contar que eles se lembrem exatamente de quem nós "fomos". Se isso é paranóia, to dentro.

Concordo com a Alice: preferiria morrer a ter de virar marionete do mau gosto latejante. hahahaha!

Beijo