quinta-feira, setembro 24, 2009

4.8


Como assim mais um ano passou e eu não vi?

Eu quis mesmo fechar os olhos para ele para não ver as coisas tristes que ele traria. Mas acabou. Meu ano novo está começando hoje e eu tenho pouco a dizer...pela primeira vez.
Eu escrevi pouco. Eu saí pouco. Eu me cuidei pouco. Eu prolonguei meu luto...
Durante esse ano, a famosa vida cor-de-rosa feita de borboletas no estômago e sentimentos tão tresloucadamente impossíveis de se atingir, foi maculada por uma dor enorme. Um buraco gigante. Um vazio maior do que o todo.
A Mercedes cor-de-rosinha se revoltou e quis saber pra que serve. Pra que serve morrer de dor? Quem ousa? Como pode? Não é para isso que ela está aqui.
Do outro lado, a Mercedes super-poderosa aguenta o rojão e diz que é preciso ter os olhos no horizonte e os pés em movimento. Em frente! Sempre em frente! Enfrente...mesmo que com o peso de todo o planeta nas costas...olhos no horizonte...
E o horizonte chegou. Está bem aqui onde meus pés estão. Não há vazio abaixo deles...há só outro modo de pisar. Descoberto isso, a dor diminui. Não o vazio...mas a dor sim.

Se eu estive perdida, hoje foi o dia em que as pessoas vieram me lembrar quem eu sou. Acordei já com o Orkut, o Facebook e o Twitter fazendo escorrer mel pela tela do computador. Não sei se existe uma forma de agradecer ao mundo pelas pessoas que eu tenho.
Eu percebi (não que não tenha visto antes) o quanto todas essas pessoas, mesmo as mais distantes, são importantes para que eu possa enxergar e colocar meus pés firmes no chão. Elas me lembram o que eu vim fazer neste mundo, para o que eu sirvo, e mostram que minha ausência só foi percebida por mim. Elas me dizem que eu estou viva e inteira. Eu posso respirar aliviada...

Então, esse texto é para dizer a todas essas pessoas o quanto eu me senti amada hoje, o quanto elas são especiais para mim. Eu só tenho a agradecer, pela vida que eu tenho, pela família incrível que me cerca, e pelos amigos maravilhosos que eu tenho ao redor do mundo.

Feliz Aniversário da Me pra vocês.


o vazio... <-- click aqui

quinta-feira, setembro 17, 2009

Cría cuervos


Eu já tive mais paciência, ou já fui mais burra?
Quantas vezes encontrei pessoas como você e senti pena, e mêses mais tarde descobri que estava criando uma cobra para me morder? Cría cuervos, y te sacarán los ojos - diz o provérbio espanhol. Mas eu sempre me tive num conceito muito alto...muito fora da realidade. Quem sou eu para poder com quem ninguém pode?
À primeira vista, contando as histórias eu sou burra. Mas ah! que simples seria ser burra. Eu sempre acho que posso com tudo, essa é a verdade.

Então a pobre menina infeliz entra na minha vida sem ser convidada. Ela é um nada. Não fede nem cheira. Não tem nada em comum comigo a não ser um emprego na mesma empresa. Ela vem se chegando e eu não me importo...imagina! Ela é tão um cocô que dá até pena. Sozinha na cidade, sozinha na existência dela, sozinha...E eu? Eu sou feliz, eu tenho família, eu tenho amigos, eu tenho um salário pra lá de decente. Estou resolvida. Custa? Me diz: custa oferecer a mão a uma alma desprovida de alegria. Eu respondo: CUSTA! Mas continuemos.
Um dia, a pessoa bate na minha porta as dez da manhã e solta a seguinte frase:
"Oi gata! Vim te fazer companhia."

Hello? Quem pediu companhia? Que mania insuportável essa das pessoas acharem que eu sou sozinha! Okay, entra, fazer o que?(NÃO! NÃO DEIXA ENTRAR!) Desse dia em diante, eu não tive mais vida. Essa criatura chegava todos os sábados às dez da manhã e só ia para casa dormir para voltar no domingo. Ela se aproximou de um por um dos meus amigos. Saiu com um por um dos meus "pretendentes". E o que eu fazia? "Ah coitada...deixa...ela nunca teve nada disso."
Ai meu Jesus cristinho...como pode?
Aí é como um viciado que diz para si mesmo que quando quiser pode parar de usar a droga. Não amigo...não pode. Principalmente se a droga for uma garota gaúcha folgada e mal caráter. Ela vai roubar a sua alma.
Levei um ano inteiro para conseguir afastar essa pessoa nociva da minha vida. Neste tempo ela tentou me derrubar profissionalmente, pessoalmente e até espiritualmente. Ela tirou coisas que eram minhas e talvez tenha atrasado minha vida em alguns anos. Isso porque eu achei que poderia controlar meus corvos.

E os anos passam...e eu encontro a versão masculina dela. Pessoa adorável, solícita, confiável, e ah...custa o que deixar se aproximar? Nada! CUSTA! E nesse caso quase custa a vida. Mas vamos mudar de página.
Coloquei dentro de casa para cuidar das minhas coisas uma pessoa esperta, confiável, forte, adorável...e fui roubada até os dentes. Dessa vez não espiritualmente ou profissionalmente, mas materialmente mesmo. E ela chorou quando foi embora (assim como os outros) por que me amava e não queria me magoar, e estava sendo injustiçada.
Cría cuervos, y te sacarán los ojos!

Depois de um tempo arrancando partes do meu corpo para tampar os buracos dos corpos alheios, eu aprendi duas coisas:
1. Não, eu não posso com os corvos e eles vão arrancar meus olhos assim que eu cochilar.
2. Psicopata não tem ética ou limites...e sempre tem um por perto.

E aí me aparece você, doce senhora nos seus cinquenta e poucos anos, mãe descompensada de uma família idem, cheia de problemas e ainda tão amável, tão generosa, tão encantadora....e por muito pouco eu não deixo você ser mais um corvo comendo os restos da minha comida. Mas sabe o que acontece? Eu não tenho mais paciência. Eu não sou mais boazinha. Eu não entrego mais as minhas migalhas para ver meu bolo ser tomado inteiro depois. Eu ouvi os seus lamentos, suas paixões, seus problemas adolescentes ridículos...eu tive paciência porque...o que custa?? É só ouvir, é só reponder "an-hã", é só uma palavra de consolo...mas você passou de todos os limites e adivinha? Você falou mal das pessoas que eu gosto, minha senhora, e eu não quero ser parte da sua doença. Desculpa, eu parei a criação de corvos.
Foi um prazer.




(não revisei isso ainda. Dever ter montes de erros. Sorry!)



sábado, setembro 12, 2009

Hoje

Era fim de tarde. Aquela hora que o sol invade a minha casa toda branca e ela empresta as cores do paraíso. Sei lá por que, eu comecei a andar pela casa e observar coisas que, daqui da minha cadeira, eu acabo esquecendo de olhar.
Fui para o jardim e descobri que as arecas cresceram muito. Eram minúsculas e mal cumpriam a função de separar o que de direito, mas hoje tomam tanto espaço que cobrem metade da casa. As alfazemas estão floridas e espalham um cheiro delicioso pelo jardim.
Passei pelo Charlie - um sapo/príncipe que aparece quando chove e tem que ser salvo da piscina quase todos os dias - e descobri novos desenhos nas costas dele. Um gato dormia na espreguiçadeira, outro na cadeira da varanda, outro jogado no terraço com as pernas caídas para fora; enquanto a Mini se esfregava nas alfazemas como se quisesse se perfumar.
Voltei para a sala desenhada pelo sol, sorri vendo as rosas que coloquei na mesa hoje...meus sofás, os livros na mesa de centro, as gordas na lareira, o tapete que eu gosto, minha Marilyn em cima do piano. Até toquei piano, como se eu fosse capaz.
Olhando a varanda lembrei do meu pai sentado ali, lendo jornal, esperando o dia passar e chorei. Me dei conta de que já vivi muita coisa nessa casa e gosto demais de pensar em todas elas...
Existem esses momentos em que a vida pára para eu poder relembrar como cada coisa foi parar onde está - eu inclusive.

Quando minha excursão terminou, eu estava sorrindo, meio emocionada, meio maravilhada com a vida que eu tenho. Não pelas coisas grandes, mas pelos detalhes. Por essa satisfação gratuita, essa felicidade boba, essa alegria que, mesmo nos dias tristes, caminha comigo.

Charlie

Era só.

Bom dia.

sexta-feira, setembro 11, 2009

borboletas no estômago de deus

Nebulosa Butterfly - NGC 6302

Fotografada pelo Hubble, agora que ele funciona direito.
Créditos: NASA, ESA, e Hubble SM4 ERO Team

terça-feira, setembro 08, 2009

Dorothy



Era uma noite qualquer de inverno. Virada de século.
Um encontro casual no portão de ferro mudou o rumo das coisas para aquela mulher que não via na vida novidade possível.
Prontificou-se a abrir o portão. Parecia uma noite qualquer, mas a luz entre as folhas das árvores revelou um olhar ainda não percebido. A força dos olhos percorreu o corpo e encontrou o estômago vazio despreparado, como uma faca afiada, suja de mel e alguma bebida embriagante.
Ela parou na porta do carro. O sapo na boca da cobra. Não sabia se mexer. Não sabia desviar o olhar.
Como se o controle remoto comandasse seus gestos, aproximou-se da janela sorrindo, apertou os olhos para ver direito, não entendeu o que viria a seguir, mas sabia que era a coisa errada-certa a fazer: provou da melhor boca que jamais provaria por dez vidas. Lembrou das bocas que beijou nas últimas dez e da voz que ouvira em sonho: "Sente este gosto".

Em segundos, gosto de pecado na boca, ela deixou de existir para ser Dorothy. Sabe Deus de onde vinha Dorothy: se de outra vida, de outro universo, da vontade de não ser ela para poder transgredir sem culpa. Entregar-se àquele beijo e não deixá-lo acabar.
Mal sabia Dorothy. E não queria saber. Queria todos os dias mais e mais e mais beijos apaixonados, moles, molhados, lambidos, macios, hipnotizantes, de faca afiada com mel e alguma droga alucinógena. Não tinha trabalho. Não tinha família. Não tinha passado. Dorothy e sua boca eram a única vida existente num universo de transgressão.

Sexo. Claro que os beijos não vinham sozinhos. A boca de Dorothy não podia parar. Queria explorar, queria sentir o gosto do desejo e de tudo que vinha dos olhos de faca.... Queria provar do mel e da droga. Queria engolir a vida aos tragos. Queria morrer com o sabor do beijo.

Não havia lugar onde seus desejos não coubessem. O mundo inteiro era o quintal da casa daqueles e suas bocas. Em cada casa havia um elevador, um banheiro, uma cozinha, uma mesa. Em cada escritório havia um hall, um tapete, uma garagem, uma sala de reuniões. Em cada jardim havia um carro, uma árvore, um muro, um banco. Em cada hotel, cada avião, cada caminho, cada parque, cada igreja.
Os beijos tornaram-se vicio. O sexo tornou-se arte. Invenções. Brinquedos. Comidas. Amarras. Fantasias. Segredos sussurrados nos ouvidos durante o trabalho. Olhares cortando salões durante solenidades. Dorothy! A mais poderosa das amantes era agora a dona da faca afiada suja de drogas alucinógenas. Vício. Vício. Vício. Testes emocionais. Resistência testada. Droga. O sexo livre de barreiras ganhava uma dimensão inimaginável. Beijos. As bocas decoram o caminho. Um beijo não é mais um beijo. Dorothy rainha do sexo sabia agora usar a voz. Dona dos olhares de faca, arrancava suspiros à distância. Era possível fazer sexo com os olhos. Vício!
Era possível não respirar. Era possível levar à loucura com o mover de um músculo. Um sorriso. Um toque. Um suspiro ao telefone.
Dorothy morria por sexo. Matava por beijos. Roubava os olhos de faca de todos os seus afazeres. Tornava-se o vício e a loucura de quem só queria o controle do portão.

Mas chegou o dia da guerra dos mundos de Dorothy. A loucura era grande, mas não maior do que a vontade de lembrar seu nome. Dorothy partiu. O olhar de faca perdeu seu brilho. A vida voltava sem novidades.
Pobre Outra! Até hoje vaga pela vida, jurando não ter visto os olhos, não ter sentido os beijos, não saber o gosto do vício. Ainda procura em silêncio por outra boca.
O que não sabe, é que quando furou os olhos para não mais provar do beijo, o poder de ser Dorothy morreu. O encanto foi quebrado. Não haverá outro beijo. Nunca mais faca suja de mel. Nunca mais no quintal de sua casa brotará desejo...

Ficou provado que Dorothy habitava o universo paralelo de onde veio o moço do portão. Não há outros como eles. Não adiantaria buscar. Este é o definitivo, irreversível, inquestionável fim da existência de Dorothy - Rainha dos olhos de faca, dona da droga e do desejo que alucina.

Dorothy - Set 1999 (postado em Set 2005)